É curioso estar a escrever este artigo. Quando me vi diante da decisão sobre que curso superior escolher, estive dividida entre Gestão de Recursos Humanos e Gestão e Direção Hoteleira. Acabei por seguir o caminho da Gestão de pessoas, mas a vida, com o seu subtil sentido de ironia, trouxe-me agora até aqui, a escrever precisamente sobre um tema que, de certa forma, ficou em pausa, mas nunca esquecido.
Aceitei o convite com entusiasmo, não apenas por interesse pessoal, mas por uma convicção que cresce a cada ano: as competências humanas são essenciais, sejam quais forem os setores ou profissões. E talvez nenhuma área ilustre isto tão bem quanto a hospitalidade.
Falar de hospitalidade é falar de relações humanas. É um setor em que o contacto interpessoal não é apenas uma parte do trabalho, é o seu coração. Quem escolhe esta área não o faz só por vocação técnica, mas também por gosto pelo acolhimento, pela empatia, pela arte de saber estar.
As chamadas competências transversais, também conhecidas como soft skills, são cada vez mais reconhecidas como fundamentais. Comunicação eficaz, escuta ativa, pensamento crítico, gestão de conflitos, capacidade de adaptação, inteligência emocional, trabalho em equipa, entre outras.
E não se trata apenas de perceções. Em Portugal, os dados também apontam nesse sentido.
Segundo o estudo “Que competências para a formação superior em gestão hoteleira?”, desenvolvido por António Melo (Instituto Politécnico da Guarda) e Manuela Gonçalves (Universidade de Aveiro), as competências transversais são amplamente valorizadas por coordenadores de cursos e profissionais do setor. Destacam-se a empatia, a capacidade de resolver problemas, a comunicação eficaz e a atitude proativa como elementos-chave para o sucesso na área (Melo & Gonçalves, 2023).
Outro estudo, focado na realidade dos hostels no Porto, coordenado por Ana Marques (Instituto Politécnico do Porto), aponta a polivalência, o gosto pelo contacto com o público e a gestão emocional como qualidades determinantes na contratação de colaboradores.
Estas competências, embora mais visíveis no setor da hospitalidade, não lhe são exclusivas. A verdade é que todas as profissões são, no fundo, sobre pessoas. E é nas interações do dia a dia, com clientes, colegas, superiores e parceiros, que se revela a importância de saber ouvir, adaptar-se, comunicar com clareza e manter uma atitude positiva perante desafios.
Vivemos numa era em que a tecnologia automatiza processos, mas não substitui o olhar atento, o sorriso genuíno, a empatia espontânea. A hospitalidade é, por isso, uma escola da vida. E uma referência para qualquer outro setor.
Voltar a este tema, anos depois da minha escolha académica, foi quase como revisitar um “e se” da minha vida. Mas mais do que nostalgia, esta escrita trouxe-me uma certeza: o verdadeiro valor no mundo do trabalho está na forma como nos relacionamos com os outros.
As competências transversais não são acessórios do currículo. São a sua base. São aquilo que transforma o conhecimento técnico em experiência significativa, e o simples trabalho em verdadeira vocação.
Referências
Melo, A., & Gonçalves, M. (2023). Que competências para a formação superior em gestão hoteleira? Instituto Politécnico da Guarda / Universidade de Aveiro.
Marques, A. (2020). Competências valorizadas no setor dos hostels no Porto. Instituto Politécnico do Porto.