HACCP – Essa coisa (des)complicada...

Desde o início da industrialização do setor alimentar, consequência da produção massiva de alimentos motivada pelo aumento exponencial da população mundial, surgiu a necessidade de garantir a segurança alimentar, salvaguardando, assim, a saúde pública

Fernando Santos

HACCP – Essa coisa (des)complicada...

Desde o início da industrialização do setor alimentar, consequência da produção massiva de alimentos motivada pelo aumento exponencial da população mundial, surgiu a necessidade de garantir a segurança alimentar, salvaguardando, assim, a saúde pública. Esta transformação veio gradualmente substituir a tradicional produção “doméstica”, em que cada família tinha os seus animais e cultivava os seus próprios hortícolas e frutícolas por uma oferta de produtos que chegam a nossa casa, muitas vezes, já prontos a consumir.

A primeira definição de segurança alimentar pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e alimentação), já na década de 70 do século transato, era algo que abrangia o acesso da população aos alimentos e à qualidade dos mesmos, o que sensibilizou a indústria alimentar para a importância deste conceito.  

O desenvolvimento do sistema HACCP, desenvolvido para a NASA em 1959, foi um dos primeiros passos para o aparecimento destes sistemas de controlo. O seu propósito visava garantir que as viagens tripuladas ao espaço não seriam comprometidas, devido a alguma intoxicação alimentar por consumo de alimentos impróprios.

O HACCP, sigla de “Hazard Analysis and Critical Control Points” ou em português “Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo”, está focado, como o nome indica, na análise de perigos (químicos, físicos, biológicos e, mais recentemente, também considerados os alergénios) e controlo do risco de estes perigos se transformarem numa contaminação que possa dar origem a uma intoxicação alimentar. Estes foram os primórdios dos Sistemas de Gestão de Segurança Alimentar (SGSA) que começaram por ser inicialmente adotados pela indústria. 

Numa fase mais recente, com o aparecimento de regulamentação ao nível da União Europeia para a segurança dos alimentos, surgiu, igualmente,  a necessidade de transpor o sistema HACCP para a restauração, o que se tem tornado num enorme desafio pois nem sempre é fácil aplicar um sistema originalmente desenvolvido para controlar processos industriais em unidades de restauração, de modo a garantir o seu funcionamento com resultados que se traduzam num aumento dos níveis Segurança Alimentar do produto final.

Muitas vezes, como consultor, ouvi frases como: “HACCP?” “Se foi criado para a NASA, como é que vou implementar no meu restaurante?” “Isso é impossível!” e admito que não é fácil erradicar estes preconceitos. Contudo, com a abordagem correta, é possível! Passados alguns meses de implementação do sistema, a opinião muda e temos transformado os maiores céticos, em relação ao HACCP, nos seus maiores defensores.

Nestes últimos 24 anos ligado ao setor alimentar, sendo nos últimos 14 como consultor na LusoCristal, tenho-me deparado frequentemente com clientes que nos chegam insatisfeitos de experiências anteriores de implementação de sistemas: sobrecarga de controlos e preenchimento de uma quantidade infindável de registos e formulários que exigem bastante dos recursos humanos e que acabam por incentivar a um preenchimento incorreto e pouco credível dos mesmos, comprometendo o funcionamento do sistema. Isso resulta, muitas vezes, de inexperiência, alguma ingenuidade e desconhecimento da realidade operacional na hotelaria e restauração por parte de quem fez a implementação destes processos.

Eu próprio, nas experiências que tive ligadas à operação em hotelaria e restauração, encontrei, por vezes, muita dificuldade em conseguir manter a quantidade de controlos que eram solicitados pelos consultores que nos visitavam.

Atualmente, com a escassez de recursos humanos e a otimização cada vez maior das operações, é essencial que os SGSA se adequem a essa realidade de modo que estes fluam com a operação, maximizando a produtividade dos seus recursos humanos sem nunca perder o seu principal foco: a garantia de Segurança Alimentar. Isto é possível e sempre foi um dos grandes objetivos da LusoCristal, desmistificar e descomplicar a segurança alimentar quebrando alguns tabus e apresentando sempre alternativas exequíveis, de modo a encontrar um ponto de equilíbrio entra a criatividade da cozinha moderna e a salubridade dos alimentos. Isto é possível? Claro que sim, experiência, conhecimento e acima de tudo bom senso!

A utilização de plataformas digitais, formação online, redução da utilização de documentação em papel tem sido um grande contributo para a produtividade e sustentabilidade. O desenvolvimento de sistemas de E-HACCP já existentes, ainda que em fase embrionária, trarão indubitavelmente vantagens na correta gestão e manutenção de todos os controlos e registos que poderão ser feitos de forma automática em tempo útil e com alertas de monitorização dos Ponto Críticos de Controlo (PCC).

Conseguimos hoje afirmar, com toda a certeza, que as unidades com um SGSA funcional e bem implementado conseguem melhores resultados ao nível da gestão de custos, menos desperdícios e maior produtividade dos seus recursos. 

Obrigado à Rede-T, na pessoa do Ricardo Augusto, pelo convite para partilhar um pouco da minha atividade profissional,  pelo interesse e preocupação constante em manter excelentes níveis de segurança alimentar nas unidades que dirige.
 

Fernando Santos

Consultoria de Empresas na Luso Cristal Consulting